Um dos meus lemas, no que se refere a literatura, é não ter preconceitos em relação a gêneros. E aconselho a quem quer que seja ter a mesma postura. Porque além de o discurso soar nobre, isso não impede que se tenha preconceito em relação a alguns autores – eu tenho ao Augusto Cury, por exemplo (apesar de isso não ser nada nobre).
Porém, não tenho graaande resistência a gênero algum. Nem mesmo à autoajuda, tão achincalhada por escritores e intelectuais. Mas confesso que o mais próximo que cheguei dela foi comprar, anos atrás, alguns títulos que até o momento não li. Entretanto, me agrada muito a autoajuda empresarial ou a autoajuda cult – eu colocaria nessa categoria livros como “O poder do hábito”, que comprei meses atrás e recomendo efusivamente, e “Rápido e devagar”, que está na minha mira, para quando tiver tempo e, principalmente, dinheiro.
Essa foi a opção que fiz na condição de leitor. Na condição de profissional das letras – no meu caso, revisor e preparador de textos, além de resenhista -, não há muita escolha. Leio de tudo, sem nenhum tipo de restrição. Escolher com qual gênero trabalhar, nesse caso, seria como, na livraria em que trabalho, atender apenas a clientes que estivessem buscando por livros de Philip Roth, J.M. Coetzee, Dostoiévski, Saramago, Fernando Sabino, Otto Lara Resende e outros do mesmo quilate. Se assim fosse, eu morreria de fome.
Ter a mente e o coração abertos para os livros – o mesmo vale para discos, filmes, enfim, artes de um modo geral – significa se dar a oportunidade de descobrir uma obra que, por sua livre e espontânea vontade, você jamais conheceria. Às vezes isso pode acontecer por uma indicação de alguém, ou por um passeio descompromissado em uma livraria. No meu caso, a oportunidade apareceu através de um trabalho.
(Se digo que a oportunidade foi derivada de um trabalho não o faço por pedantismo, mas sim para deixar claro ao leitor que há, entre o livro e eu, muito mais que uma relação entre um livro e um leitor.)
O livro em questão é “Um motim no tempo” (Seguinte, 239 págs., R$ 24,90), do escritor norte-americano James Dashner. Recentemente publicado no Brasil, ele é primeiro dos sete volumes da série “Infinity Ring” (“Anel do Infinito”) – os outros seis também serão editados pela Seguinte, e cada sequência será escrita por um autor diferente, exceto o último, que voltará para as mãos de Dashner.
Em “Um motim no tempo” somos apresentados aos protagonistas da série, Dak Smyth e Sera Frost, dois gênios precoces – ele, aficcionado por história, e ela, por física – de apenas onze anos de idade. O enredo do livro é bastante perspicaz: o mundo, que é dominado e controlado por uma organização chamada SQ, está entrando em colapso. O motivo? A História da Terra sofreu algumas “fraturas”, algumas alterações. Para que o planeta volte à sua normalidade, seria necessário voltar no tempo e corrigir essas fraturas. E é aí que entram Dak e Sera.
Os pais de Dak são cientistas que, em segredo, trabalham na construção de um dispositivo que, se finalizado, permitirá a viagem no tempo. Um belo dia – peço licença ao leitor para utilizar essa construção -, os pais de Dak viajam, e Sera tem a oportunidade de vasculhar o laboratório deles. Ela encontra o protótipo do dispositivo e consegue concluí-lo. Está criado o Anel do Infinito. E então a aventura tem início.
Quando sr. e sra. Smyth voltam para casa e ficam sabendo o que Dak e Sera fizeram, ficam alarmados. Eles sabem que são monitorados pela SQ – que, aliás, financia as suas pesquisas -, e sabem também que, se a organização descobrir que eles conseguiram finalizar o Anel do Infinito, terão muitos problemas.
O primeiro deles se apresenta na primeira viagem no tempo feita por eles. A ideia dos pais de Dak era somente testar o anel. Mas Dak e Sera pegam uma carona e acabam causando algo terrível: sr. e sra Smyth se perdem no tempo. Quando Dak e Sera retornam, a SQ já dá sinais de que sabe da existência do Anel do Infinito, e os perigos começam a ficar bem maiores.
No decorrer do livro Dak e Sera descobrem que precisam ir para a Espanha, mais precisamente para a Espanha de 1492. É lá que está a primeira fratura confirmada, e ela envolve um certo Cristóvão Colombo.
Entre os maiores trunfos de “Um motim no tempo” estão a mistura de ficção científica com história e a narrativa ágil e bem-humorada de Dashner, mas talvez o maior deles seja as especulações sobre quais rumos nosso planeta tomaria se alguns fatos da nossa história não tivessem acontecido da forma que aconteceram. É a velha história do “e se”, ou, se o leitor preferir, dos detalhes. A diferença que um mínimo detalhe pode ter na vida de alguém – no caso do livro, de todo planeta.
Apesar de ser voltado para o público jovem, “Um motim no tempo” pode ser uma grata surpresa para leitores mais “idosos”. Basta ter o coração e a mente abertos.