Todos os dias faço apressado o percurso trabalho-casa. São vários os motivos da pressa. O simples fato de chegar logo em casa é o principal, mas atrelado a isso há diversos outros fatores: checar meus emails, enviar emails, ler as notícias do dia, entre outras coisas. Ontem, porém, decidi voltar sem pressa. Comprei uma coisa bastante nutritiva para comer no caminho – uma batata frita – e voltei andando despreocupadamente.
O shopping onde trabalho fica de cara para uma das avenidas mais movimentadas da cidade. Geralmente eu atravesso os dois lados dela e volto caminhando pelo passeio, mas às vezes acontece de atravessar um dos lados, andar um pedaço pelo canteiro, e depois atravessar para o outro lado. Foi o que aconteceu ontem. Mas, antes de eu atravessar para o passeio, um carro desgovernado invadiu o canteiro e bateu em uma árvore poucos metros a minha frente.
Sou do tipo de gente que simplesmente não sabe lidar com situações assim. A batida não foi forte, mas eu deveria ter ido tentar ajudar quem estava no carro. Em vez disso, fiquei parado uns bons segundos no canteiro, angustiado, desejando chegar ao outro lado o mais rápido possível, sendo impedido pelo vai-vai dos carros. Felizmente logo em seguida várias pessoas foram verificar a situação do motorista (aparentemente havia apenas uma pessoa no carro). E em pouco tempo eu estava no passeio.
Tenho consciência de que minha atitude não foi nada nobre. Por estar mais próximo da vítima, eu deveria ter deixado a batata frita de lado e ter tentado prestar algum auxílio. Mas não consegui e peço perdão a Deus por isso.
E eis que chegamos ao cerne deste post: Deus.
Já faz um bom tempo que venho tentando encontrar uma maneira que não pareça forçada para falar dEle. E que não me faça parecer um daqueles fiéis cegos, quase fundamentalistas. Acho que finalmente encontrei, se não a maneira, ao menos a hora, o momento.
A bem da verdade, eu já falei sobre isso uma vez. Mas a ideia de escrever novamente sobre o assunto vinha ecoando em minha mente há meses.
Antes de atravessar o primeiro lado da avenida calmamente, caminhando sem pressa, eu pensei em percorrer esse curto trajeto correndo, num daqueles momentos em que carros estão vindo mas você sabe que, se der uma corridinha, conseguirá chegar são e salvo ao outro ponto – que era o canteiro. Mas alguma coisa me fez sentir – ou me “disse” – que eu deveria esperar e caminhar sem pressa, afinal, eu havia decidido voltar tranquilamente para casa. Foi o que fiz.
Tenho certeza de que esses segundos me livraram de alguma coisa. O carro poderia ter me acertado em cheio ou poderia ter me acertado de raspão, mas eu sei que me livrei de um mal. Melhor dizendo: fui livrado de um mal. Mais certeza ainda tenho de que fui impedido de atravessar o primeiro pedaço da avenida às pressas por… Deus.
Antes de concluir, gostaria de abrir um parêntese para uma declaração do jornalista Marcos Losekann em entrevista no Programa do Jô, em maio de 2009:
“Eu tenho uma explicação simples pra comprovar a existência de Deus. Eu tenho. Veja você: a gente acredita em tudo que é possível, e em tudo que é impossível. A gente acredita em universo, que continua se expandindo; a gente acredita em galáxias que não se sabe onde começam, onde terminam; a gente acredita em via-láctea; a gente acredita em coisas inimagináveis, só em Deus a gente prefere não acreditar. Só Deus não existe. Só o maestro pra reger tudo isso não existe. O resto todo existe. Então acho tão simples acreditar em Deus… É tão natural que exista alguma coisa que controle isso tudo. (…) As pessoas acham démodé acreditar. Há um patrulhamento ideológico em acreditar. Jornalistas, via de regra, não podem acreditar. Por que não? Eu acredito. E eu tenho o telefone Dele, falo com Ele direto, tranquilo.”
Fui criado sob o catolicismo mas já tive meus perrengues com Deus e com a Igreja, e cheguei a questionar minha fé uns bons (?) anos atrás. Mas minha fé prevaleceu, livre de amarras com quaisquer igrejas. Quando perguntam se tenho religião, respondo que minha religião é acreditar em Deus. Nada contra quem não acredita, por favor. Nem contra quem tem outra religião. Respeito todos os credos – e a falta de credo -, tenho amigos ateus, católicos e evangélicos. A intenção aqui não é fazer propaganda de uma crença, muito menos lamentar outras ou a falta de alguma. A intenção é apenas explicitar a minha crença e contar essa história que me deixou bastante impressionado. Até porque não é a primeira vez que sou livrado de um mal. A outra prefiro não contar, ao menos por enquanto: há anos que pretendo escrever um conto a partir dela.