Acontece com todo mundo: duas pessoas estudam juntas, têm uma relação de amizade nos tempos de escola e/ou colégio, o tempo e as circunstâncias os afastam e, se não se encontrarem por acaso, pode ser que cheguem a esquecer um do outro.
O que não acontece com todo mundo é, depois de uma tragédia na vida de uma dessas pessoas, ela encontrar aquele velho amigo da juventude e, ao saber que esse velho amigo está passando por um péssimo momento financeiro, convidá-lo para fazer uma viagem, bancando todas as suas despesas. Esse é, resumindo de forma grosseira, o gatilho de “A viagem de James Amaro” (Língua Geral, 2015, 160 págs.), mais novo romance de Luiz Biajoni.
James Amaro é um advogado bem-sucedido cuja namorada, após ele terminar o relacionamento, tenta cometer suicídio. Para fugir do redemoinho de aborrecimentos que isso desencadeará, ele resolve fazer uma viagem, ainda que isso contrarie as mais básicas recomendações legais. Antes, porém, vai a um supermercado comprar algumas coisas, e é lá que encontra seu amigo de juventude, Alex Viana, um professor de inglês que, no momento, além de estar devendo alguns meses do aluguel do apartamento, só tem dinheiro para sobreviver por mais alguns dias.
Apesar das circunstâncias que ambos estão vivendo, o reencontro é animado. Os dois conversam por alguns minutos e então surge o convite. Sem ter qualquer perspectiva – quer dizer, ele tinha apenas uma: o suicídio -, Alex aceita acompanhar o amigo rumo a Paraty. E, nessa viagem, como acontece em todo filme ou livro que tenha uma viagem como pano de fundo, os protagonistas terão suas vidas modificadas.
Porém, além das mudanças – se para melhor ou não, só lendo o livro -, segredos de Alex e James vêm à tona durante a viagem, e são eles os pontos altos do livro. Mas, para manter o mistério e causar no leitor grandes impactos à medida que eles vão sendo revelados, o autor fez uma manobra arriscada, pois em alguns momentos o leitor pode se perguntar, como um passageiro que não sabe o seu destino, para onde está indo, para onde o estão levando. Uma manobra arriscada, mas acertada. Biajoni consegue levar várias pequenas tensões a pontos máximos, e é no auge delas que os segredos são revelados, causando grandes impactos.
Embalado pelo jazz do início ao fim – as citações de discos, músicas, cantores e cantoras são um prato cheio para os amantes do gênero -, “A viagem de James Amaro” é muito mais que um livro sobre velhos amigos que se reencontram e desabafam seus problemas, suas angústias. “A viagem de James Amaro” é um livro sobre até onde o amor pode nos levar, sobre o que somos capazes de fazer por amor, ainda que isso possa nos fazer cometer atos impensados, de generosa loucura – ou, pior, atos condenáveis.
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No posfácio, escrito por Daniel Martins, professor e diretor teatral, ficamos sabendo, entre outras coisas, que “A viagem de James Amaro” foi inspirado em fatos reais, e que outra pessoa assinaria o livro – Biajoni seria apenas um ghost writer. Detalhes interessantes e pertinentes, é claro, mas que não justifica um texto tão longo, que poderia ser mais breve. É a única ressalva que faço.
E não posso dar este texto como encerrado sem antes destacar a belíssima capa do livro, cuja ilustração foi feita pelo também escritor Lourenço Mutarelli.